quinta-feira, 6 de julho de 2017

Homem-Aranha: De Volta ao Lar

Direção: Jon Watts
Roteiro: Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Jon Watts, Christopher Ford, Chris McKenna, Erik Sommers
Elenco: Tom Holland, Michael Keaton, Marisa Tomei, Robert Downey Jr., Jon Favreau, Jacob Batalon, Laura Harrier, Zendaya

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Yo! How's it going?

Comecei este blog anos atrás falando sobre "O Espetacular Homem-Aranha". Meu carinho e envolvimento com o personagem foram decisivos em minha escolha, e não havia melhor forma de começar um blog sobre cinema, literatura e quadrinhos do que discutir o que era, na época, o filme mais recente do super herói mais importante da minha infância, adolescência e até mesmo idade adulta. Hoje, apesar de não dispor de muito tempo para a
bastecer o blog como antes, forcei-me a encontrar um tempinho para falar sobre a terceira versão do Teioso nos cinemas, agora devidamente integrado ao MCU (Marvel Cinematic Universe) através de seu novo longa, Homem-Aranha: De Volta ao Lar. 

Plano de fundo: Peter Parker (Tom Holland) não é apenas um aluno do segundo ano do ensino médio. Além de seus estudos e obrigações perante sua tia May (Marisa Tomei), o jovem aspira voos muito maiores: dentre eles o sonho de se tornar um dos Vingadores e usar seus poderes para proteger o mundo de qualquer grande ameaça por vir. O que o garoto não sabe, contudo, é que a estrada para que ele vire o herói que deseja é muito mais árdua do que o imaginado, e seu primeiro grande teste será enfrentar Adrian Toomes (Michael Keaton), uma vítima injustiçada do rastro de destruição dos Vingadores que age como contrabandista de tecnologia alienígena desde a Batalha de Nova York. 

Papum: Sempre fico apreensivo quando o tópico é um novo filme do Homem-Aranha. Afinal, as últimas três experiências que tivemos com o Cabeça-de-Teia nas telonas se provaram por vezes frágeis, outras vezes confusas e, em alguns instantes, simplesmente ridículas. Assim sendo, uma boa dose de calma foi necessária ao encarar o projeto da Sony em parceira com os Estúdios Marvel, o que certamente garantiu que De Volta ao Lar tivesse um bom respiro para encontrar seu próprio caminho. 

Se o director Jon Watts vinha declarando há meses que as comédias adolescentes oitentistas de John Hughes seriam a maior inspiração por trás do filme, isso fica muito claro desde o início. Além de divertidas, todas as cenas dentro do colégio ajudam a construir o ótimo relacionamento de Peter com Ned (Jacob Batalon), e a dupla abusa de uma química poucas vezes vista no cinema entre um super herói e seu ajudante. Da mesma forma, Michelle (Zendaya) surge com força e sagacidade ao ser a presença feminina que está sempre a orbitar a dupla, dando diversos indícios de que será melhor desenvolvida ao longo da saga. Fica por conta do experiente Michael Keaton, então, contrabalancear essa juventude e leveza ao representar uma ameaça maior do que qualquer coisa que Peter enfrentou até o momento, e as motivações que levam seu personagem, Adrian Toomes, ao mundo do crime são simples, efetivas e sólidas. Ponto para a equipe criativa do projeto, que soube fazer de um vilão difícil de ser trabalhado nos quadrinhos um dos antagonistas mais reais do Universo Marvel nos cinemas.

Contando com um senso de humor tão sagaz quanto às vezes ingênuo, Tom Holland é, sem sombra de dúvida, o ator que mais carrega o espírito do Peter Parker que crescemos lendo nos quadrinhos. Sua bondade e otimismo constantes não o tornam socialmente estranho e boçal como o Peter de Tobey Maguire, ao mesmo tempo em que sua agitação e ironia não fazem dele o personagem cool e desconfortavelmente ácido de Andrew Garfield. A mistura funciona, apresentando-nos um protagonista ainda inseguro, mas muito motivado por seu senso de dever para realizar seus atos altruístas de heroísmo.

Para quem esperava (ou temia) que Tony Stark (Robert Downey Jr.) pudesse roubar a cena, é uma pena (ou alívio, no meu caso) dizer que o personagem é limitado a participações pontuais que servem única e exclusivamente para auxiliar o desenvolvimento de Peter em sua jornada. Obviamente, muitas risadas continuam a seguir sua personalidade caristmática, enriquecida agora por um novo sentido de responsabilidade para com seu menino prodígio. O resultado funciona bem dentro do Universo Marvel estabelecido nos cinemas, o que deve acalmar os nervos dos fãs mais conservadores ou xiitas do aracnídeo por aí.

Em meio a tantas inovações bacanas (ponto para o novo uniforme), dinamismo e bom humor, alguns cortes estranhos e montagens apressadas não comprometem a apreciação do filme. O que pode incomodar um pouco é a falta de gravidade nos movimentos feitos pelo herói em suas cenas de computação gráfica, o que havia sido um dos grandes acertos dos filmes de Marc Webb e suas sequências aéreas belíssimas de serem contempladas. Por outro lado, a diversidade na montagem do elenco mostra uma preocupação grande do estúdio em realmente fazer do Homem-Aranha o Amigão da Vizinhança, aquele que não está rodeado por deuses ou seres cósmicos, mas sim pessoas comuns como eu e você. A releitura, eficaz e necessária, escorrega apenas em subestimar o apego que os fãs dos quadrinhos têm com certos nomes e características marcantes de seus personagens - o que seria facilmente contornável se, em vez atirar nomes conhecidos no liquidificador, os roteiristas houvessem demonstrado mais coragem ao criar simplesmente novos personagens que são, sim, muito bem-vindos ao rico e diverso mundo de um dos super heróis mais populares do planeta.  

Agora 'nuff said. O que vocês acharam da nova aventura do Homem-Aranha? Estão animados com os novos prospectos para o Teioso? Deixem seu comentário e até mais!  

  
In a nutshell:

- Homem-Aranha: De Volta ao Lar -
Thumbs Up: senso de humor jovial e dinâmico; excelente química entre o elenco; trama simples, direta e coerente; ótimos arcos de desenvolvimento tanto do herói quanto do vilão; Tom Holland e seu espírito leve e otimista; trilha sonora animada e mais do que condizente com o filme; cenas de ação inventivas;
Thumbs Down: conexões forçadas entre nomes dos quadrinhos e suas novas representações; efeitos visuais por vezes pouco inspirados;

domingo, 21 de maio de 2017

Rei Arthur: A Lenda da Espada

Direção: Guy Ritchie
Roteiro: Guy Ritchie, Lionel Wigram, Joby Harold
Elenco: Charlie Hunnam, Jude Law, Eric Bana, Djimon Hounsou, Àstrid Bergès-Frisbey

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Yo! How's it going?

Embora tenha deixado de abastecer este blog há bastante tempo, por vezes encontro assuntos que simplesmente não posso deixar passar, como é o caso do tópico desta postagem. Levando em conta os anos de pesquisa, viagens e estudos sobre literatura e história arturiana e celta para a produção do meu novo livro, Alec Dini e o Vórtice do Tempo, senti que deveria retornar à página Streampunk para comentar o filme Rei Arthur: A Lenda da Espada.

Plano de fundo: Quando o rei Uther Pendragon (Eric Bana) usa a espada Excalibur para derrotar o feiticeiro Mordred, todos pensam que a Inglaterra enfim terá seu período de paz. No entanto, o irmão mais novo do rei, Vortigern (Jude Law), tem seus próprios planos para o futuro do reino e, em um ato de traição empoderado por magia negra, livra-se de Uther e sua esposa. O que Vortigern não consegue, contudo, é desfazer-se do pequeno Arthur (Charlie Hunnam), filho de Uther e único capaz de embanhar Excalibur para ameaçar seu longo reinado.

Papum: Tentarei ser o mais breve possível nesta resenha, mas confesso encontrar muita dificuldade em começar a teia de comentários que tenho para o filme. Primeira e sumariamente, então, abordarei o trabalho do diretor e roteirista britânico Guy Ritchie naquele que considero ciclo mitológico mais imporante para mim.

Dono de um currículo de prestígio popular pontuado por filmes como Snatch e Sherlock Holmes, Ritchie foi contatado pelos executivos da Warner Bros. para recriar e iniciar o que deveria ser uma franquia vindoura de filmes (especula-se seis) baseados nas inúmeras lendas e mitos de Artur e seus cavaleiros. A confiança no diretor era tamanha, na verdade, que Ritchie contou com a quantia colossal de $175 milhões para o orçamento do filme. O resultado, porém, soa como um verdadeiro insulto àqueles que gastaram mais do que algumas horas pesquisando nomes e trechos do acervo arturiano no Wikipedia; assim como àqueles acostumados ao padrão de qualidade arturiana de As Brumas de Avalon ou O Rei do Inverno, escritos por Marion Zimmer Bradley e Bernard Cornwell, respectivamente.

Adotando jogos de câmeras frenéticos aliados a uma tempestade de efeitos visuais, Ritchie deixa claro desde o início que estamos prestes a ver uma abordagem moderna disposta a transformar a lenda em um espetáculo de ação. Isso não seria problema algum, vejam bem, se o diretor não se desfizesse dos contextos cruciais que tornam Artur uma das histórias mais queridas e influentes do mundo ocidental. 

Esqueça qualquer origem celto-romana, galesa ou até mesmo cristã das primeiras menções literárias a Artur: estamos aqui diante de uma trama que, a não ser por algumas construções romanas em Londinium, não tem qualquer preocupação histórica ou simbólica para seu mundo, aproveitando-se de um vilão conhecido dos anais da história britânica como o rei Vortigern (um dos maiores responsáveis pela invasão anglo-saxônica na Grã-Bretanha) somente para torná-lo uma figura caricata cujos rituais mágicos lhe conferem poderes dignos de jogos de videogame. Ansioso por deixar sua própria assinatura na lenda, então, Ritchie faz o que há de pior em qualquer abordagem arturiana no cenário contemporâneo: em suas mãos, nomes como Mordred, Tristan, Bedivere e Percival viram apenas commodities usados sem qualquer aprofundamento ou personalidade desenvolvidos, como se sua presença pudesse agradar aos fãs da mesma forma como a participação especial do amigo do diretor, David Beckham. O resultado é uma horda de personagens vazios, artificialmente reunidos também pela iniciativa hollywoodiana de inclusão: há um chinês, um negro, um marroquino e uma mulher, o que seria ótimo caso não fossem todos marionetes tão desinteressantes quanto os amigos de Artur, cujos apelidos são a única coisa digna de menção, subvertendo os títulos de nobreza carregados pelos Cavaleiros da Távola Redonda.

Agora que chegamos a esse ponto, podemos destacar também a tentativa interessante de tornar Artur o herói do povo. Criado em um bordel, o jovem é um produto das ruas, o que ajuda a moldar uma personalidade marrenta que, apesar de tudo, guarda um grande sentido de justiça dentro de si. O grande problema, no entanto, é a contradição que isso causa: apesar de sua criação ligada ao proletariado de Londinium (maior razão para o personagem entender o sofrimento do homem comum), Artur só é capaz de embanhar Excalibur graças ao lado nobre de seu sangue, o que coloca em cheque o conflito inteiro. O herói do povo, como Ritchie tanto tenta demonstrar, não teria condições de ser herói algum sem sua linhagem, que é o verdadeiro elemento por trás do uso cartunesco de uma espada capaz de desacelerar o tempo, aumentar sua força física e tornar Charlie Hunnam um boneco medonho feito de computação gráfica enquanto as câmeras de Ritchie não sossegam. A estratégia deve funcionar com o público mais jovem, mas é bizarra para aqueles que acompanharam batalhas épicas medievais como a Batalha dos Bastardos em Game of Thrones. Pior do que isso, porém, é que ao fazer de Excalibur a arma suprema, Ritchie tira das mãos e da criação de Artur o verdadeiro motivo por trás de seu triunfo. 

Adoraria discutir a fundo diversos outros elementos do filme, mas ao final do longa, a impressão que tenho é de que Rei Arthur: A Lenda da Espada não é um filme para estudiosos ou entusiastas de mitologia ou história arturiana. Da mesma forma, o filme não deve agradar aqueles que gostam de realismo mágico ou simbolismo em histórias medievais, como aqueles propostos por Excalibur, dirigido por John Boorman em 1981. Em seu cerne, o longa de Ritchie pode agradar o espectador casual que busca ação, pancadaria, muitos efeitos visuais ou temáticas batidas de jogos de RPG; nenhuma delas capaz de tirar nos dados os números necessários para que a Warner cobrisse pelo menos metade dos gastos que teve com o filme até agora. A franquia de Ricthie, pelo que parece, não tem um centésimo do vigor que ajudou a preservar a imagem do rei Artur nos últimos quinze séculos do imaginário europeu. 

  
In a nutshell:

- Rei Arthur: A Lenda da Espada -
Thumbs Up: bela trilha sonora; paisagens incríveis da Grã-Bretanha, em especial do meu amado País de Gales; sequências de ação tiradas de jogos de videogames ou desenhos japoneses;
Thumbs Down: personagens rasos; enredo sem sentido; figurinos anacrônicos; excesso de efeitos visuais, na maioria das vezes de qualidade duvidosa; falta de simbolismo ou historicidade no conflito; sentimentalismo barato; sequências de ação tiradas de jogos de videogames ou desenhos japoneses;