sexta-feira, 9 de novembro de 2012

The Casual Vacancy

Autora: J. K. Rowling
Ano de publicação: 2012


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Yo! How's it going?


É com grande prazer e uma satisfatória pitada de exclusividade que abordo em minha postagem de hoje o novo livro da escritora mais popular do século XXI: "The Casual Vacancy", de J.K. Rowling (que como qualquer mortal sabe, é a autora por trás da saga de Harry Potter). Mesmo com o lançamento da obra no Brasil marcado para o dia 12 de dezembro sob o altamente debatível título de "Morte Súbita", acho legal poder antecipar um pouco do que se passa nesse projeto que, como sua própria campanha de marketing prega, é um grande romance para uma cidade pequena. E como é.

Plano de fundo: Quando Barry Fairbrother padece vítima de um inesperado aneurisma cerebral, não é só sua tragédia que ocupa as mentes dos habitantes da pequena cidade de Pagford. Na verdade, com o posto de Barry no Conselho da Cidade subitamente vago, tem início uma impiedosa disputa de interesses entre a cúpula administrativa de Pagford cujas proporções se expandem por todos os cantos do lugar, trazendo à tona uma verdade irrefutável: Pagford é uma cidade em guerra não só política, mas altamente moral em cada um de seus núcleos familiares e sociais.

Papum: Foi com muita ansiedade e apreensão que adquiri "The Casual Vacancy", irremediavelmente curioso sobre a maneira com que J. K. Rowling daria sequência em sua carreira em um universo que não envolvesse a familiar escola de magia e bruxaria de Hogwarts ou que não tivesse bruxos mirins como protagonistas de sua história. Nesse sentido, foi até mesmo um choque observar como a temática escura da obra contrasta com o belo mundo de Harry Potter, mesmo que Rowling ainda mostre aqui e acolá tendências narrativas e descritivas familiares aos leitores de seu trabalho anterior. Pura e simplesmente por causa disso, torna-se absurdo qualquer tipo de comparação entre os dois títulos, assim como completamente descabível achar que o romance "não é nenhum Harry Potter". Ora essa, Rowling jamais quis que ele fosse, e isso não podia ter ficado mais claro, embora ainda haja aqueles que teimem em achar que a mudança foi brusca demais. É impossível que um  escritor tente competir com seu magnum opus, o que torna a quebra de cenário da autora tão inteligente quanto inevitável, ainda que alguns corações moles sejam partidos no processo.

Iniciando sua trama a partir da morte repentina de Barry Fairbrother e desenhando a comunidade de Pagford lenta e cuidadosamente, Rowling constrói seu enredo completamente apoiada no desenvolvimento de suas personagens e o jogo de mesquinhez e imoralidade que se instala em cada um de seus focos narrativos a partir do evento. Sem possuir um protagonista ao certo e alterando os spotlights da obra frequentemente, a autora oferece diversos insights extremamente competentes sobre a vida em Pagford e os problemas que cada uma de suas personagens possui: e acredite, eles são muitos. Não há nenhuma pessoa genuinamente boa na cidade, tampouco uma figura heroica entre seus habitantes. Ao invés disso, a única personagem tratada com unanimidade é o falecido Barry, e sua morte representa exatamente a morte da ética e moral dentro da cidade, abrindo caminho para uma série de entreveiros entre esposas e maridos, pais e filhos ou até mesmo adolescentes entre si que têm consequências atrozes. Rowling parece se divertir com o efeito dominó criado a partir da remoção de sua peça, e com competência ímpar (além de várias pitadas de crueldade e cinismo) expõe as grotescas falhas de caráter e problemas de sua sociedade de modo escancarado, sem medir palavras, ações ou consequências em suas descrições. Sim, refiro-me a estupros, abusos, pedofilia e violência doméstica simplesmente crus, assim como leituras inteligentes das mentes das personagens que certamente hão de deixar o leitor preocupado com o que há de mais real (e podre) no ser humano. Os habitantes de Pagford são tão bem-construídos que poderiam ser qualquer pessoa com quem temos contato, fazendo da obra um pequeno estudo comportamental desmotivador em seu resultado: qualquer ser humano é bizarramente falho e egoísta, e é inacreditável que depositemos nossa confiança em outros seres da nossa espécie. Como Pagford é um lugar pequeno, também é natural que cada ação de suas personagens tenha consequências em diversos núcleos do romance, e Rowling trata isso com muita naturalidade ao mesmo tempo em que não se perde com seu vasto elenco de personagens, outro ponto de muito sucesso da autora, que já havia mostrado sua competência com elencos grandes durante a série Harry Potter.

Em uma nota mais relativa a questões de estilo, é interessante observar como descrições físicas parecem ser muito características da autora, que não deixa passar em branco nenhuma caracterização pessoal de suas inúmeras personagens. Além disso, diversos adendos colocados entre parênteses permeiam a obra para oferecer mais sobre o passado de suas personagens, que já tinham uma vida antes de a história começar e continuam a existir depois de seu término, diferentemente do que havia acontecido em Harry Potter: a personagem tinha seu passado fortemente estabelecido e o que importava era o presente e futuro dele e seus amigos. No processo, Rowling brilha ao construir personagens que pensam diferente entre si e se comunicam de modo único, usando gírias cockney e estuary, vícios e figuras de linguagem para manter a sórdida verossimilhança daquilo que tem em mãos. Não é de se espantar, então, que um grande arsenal de palavrões ilustre a obra, recurso altamente necessário para ilustrar em particular a juventude perdida de Pagford, que entre drogas, sexo e álcool tem problemas sérios com pais violentos, omissos ou viciados. As estruturas familiares de "The Casual Vacancy" são assustadoramente complexas e falhas ao ponto de realmente não acharmos escapatória para os jovens Andrew Price, Stuart Wall, Sukhvinder Jawanda e Krystal Weedon, mas mora aí talvez a maior habilidade de Rowling em sua profissão: sim, a autora entende o mundo adolescente e sua linguagem como poucos, transitando perfeitamente entre ele e seu elenco adulto sem qualquer empecilho. Pensamentos fugazes misturam-se a planos mirabolantes e revoltas internas de modo natural, e embora não haja ninguém digno de pena, a solidez dos jovens é tão grande que não há como ficar indiferente aos problemas que cada um deles tem em mãos.

Por fim, em uma abordagem mais simbólica da obra, merece ser ressaltado como a tecnologia é um fator crucial para impulsionar o enredo e fazer os problemas de Pagford saírem do controle. Sendo uma cidade pequena e quase provincial, seus habitantes não estão exatamente acostumados a muitos recursos, e quando os jovens decidem expor sua raiva familiar para o mundo, é na internet que eles encontram o meio ideal. Tal exposição pública de assuntos familiares, no entanto, causa muito rebuliço e indignação por toda a cidade, e o anonimato de seus realizadores só contribui para o surgimento de mais fofocas e especulações que logo fogem de controle, mostrando assim o corrompimento total de Pagford a partir de seus avanços. Igualmente importante é o ciclo que se inicia com a morte de Barry e termina ao final do livro com mais mártires da guerra invisível travada na cidade, fechando assim um verdadeiro período de aparentes mudanças que tendem a retornar ao velho modo de ser da cidade. 

Por todos esses motivos, "The Casual Vacancy" não é um livro recomendado a qualquer público e muito menos a leitores casuais, impacientes ou simplesmente puritanos. No entanto, o romance é sim a prova irrefutável de uma verdade que só tolos ou anti-modistas teimam a tentar contradizer: gosto pessoal a parte, J. K. Rowling é sim uma grande escritora.

Agora 'nuff said. Falei mais do que devia e menos do que gostaria, mas fico feliz por saber que o trabalho de Rowling ainda tem ótimos frutos a oferecer. Minha admiração por ela é absurdamente grande, e é com alívio que eu termino meu texto e reflexões iniciais sobre "The Casual Vacancy" amplamente satisfeito. Continuem a seguir o blog e até a próxima!

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In a nutshell:
- The Casual Vacancy -
Thumbs Up: construção de personagens impecável; crueldade e honestidade na abordagem de seus conflitos; personagens falhas, maliciosas e complexas que amamos odiar; variações de recursos narrativos e linguajar invejáveis em seus diálogos; imprevisibilidade da trama; 
Thumbs Down: -----

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